A morte assaltou-o andando baixo aparência alienígena, levado pela economia da Estação de Minavila. Mas morrer não era uma opção para ele.
Na sua mente formaram-se projectos de sabotagem a um dos sistemas de manutenção da estação. Se a puder alcançar sem ser visto poderia conseguir um trabalho de reparação, algo para i-la virando por um dia ou dois. Mas teria que desactivar os bots de reparação primeiro, e isso era arriscado.
“Reus Saint Mark, o seu consumo de gás e água vai superar o saldo da sua conta,” informaram-no desde o sistema da cabina. “As suas seis unidades galácticas cobrirão a metade do ciclo nocturno.” Ocorreu-se-lhe que deveria regular a sua respiração para conservar o ar que lhe quedava. Botar tempo fora da sua cabina não havia de valer-lhe muito, pois cada sector analisava os Sofontes que entravam nas áreas comuns e registava o consumo de gás. No pior dos casos podia viver dentro do seu traje e deambular pelas choupanas sem ar da estação quando se esgotaram os seus fundos. As células de combustível custam menos que manter uma cabina inteira.
Não, no pior dos casos, desintegrar-se-ia.
Reus calculou quanto duraria orbitando a estação com a energia do traje. Não muito acô fora, para além das margens de ambas as duas Esferas Humanas.
“Tem você uma chamada.” O sistema projectou uma imagem sobre a sua cabeça.
Que mal-educado, abrir o comlink sem lhe pedir autorização! Provavelmente o sistema da estação sabia que aceitaria qualquer chamada.
A imagem duma Lertia entrelaçou os omatóforos diante dos seus olhos. O seu aumento seleccionou automaticamente um programa de tradução. “Velai estás.” O conjunto de omatóforos encrechava como um matufo de pelo ao redor da cabeça amarela e ovalada, as queixadas rangiam. “Vem de chegar algo que che pode interessar. Mas ao melhor podes não querê-lo porque é de preparativo urgente e não sabemos muito sobre o cliente. Porém, paga bem, por mor de alguns perigos para a saúde. O contrato contem também uma cláusula de estricta confidencialidade.”
Reus bateu-se fora da teia a lhe fazer de cama que se encolheu no tecto. A Lertia era empregada de Febra Flex, uma das agências especializadas em serviços de inter-espécies exóticas. Deram-lhe só dous choios mas ganhara abundo para se manter durante semanas. “Continue.”
“Uma nau BorboleMtidosa está para arribar num tempo de 3600 estações. A mensagem diz: a rainha necessita interacção corporal obrigatoriamente. Prefere bípedes do teu tipo físico geral. São de esperar alguns danos menores.”
* * *
O dever significava mais do que a vida para Reus neste ponto, mas, para levá-lo a cabo, tinha que viver. No Elo de Minavila, o único buraco de minhoca que concatenava o conglomerado de Thuurin e as Esferas Humanas, vender os serviços de um mesmo, as emoções e a alma, para entretenimento, era uma profissão.
Para Reus significava sobreviver, se sobrevivia os riscos da profissão. Levava acô preso perto de um ano terrestre, a aguardar que aproasse qualquer espaçonave dos mundos da Liga Interior. Mesmo uma nave antiquada do tipo Terratizador do Foramundo lhe valeria. Desafortunadamente, as naves das Esferas Humanas raramente se aventuravam tão longe no braço de Sagitário da galáxia. Reus era um piloto condenadamente bom, mas isto não importava na Estação de Minavila, como lhe dissera repetidas vezes o sistema da estação. Havia espécies com duas cabeças ligadas para interactuarem com qualquer sistema que for, dotadas com vários apêndices manipuladores. Faziam que ele parecera uma lagáchema em comparança.
Outro dia, outro choio desenxabido. Reus caminhou pelo Sector Oxi cara à sala de espera de Cctavilhão, o desenhador de fetiches e moldador de febra. Deu-lhe um ataque de espirros. Olores estranhos, azedos, vegetais e barolentos assaltaram-lhe os focinhos. Um grupo de Rootrasgos baixou de uma Loja Sensorial e parou quando o viu, as suas glândulas das ventas saboreavam o ar. Pôs-se teso mas continuou caminhando e finalmente ultrapassou-os. O lene amaneiramento dos seus vestidos cingidos e o seu fedor a carne podre que coalha no nariz chegaram até ele. Sentiu-os nas suas costas, as suas glândulas a procurarem-no e estremecerem-se desejando-o. Eram adictos às emoções, podiam chupar uma mente humana e deixá-la seca em minutos.
Passou do corredor e parou na entrada do metro. As luzes piscaram e um veículo de forma centípeda entrou a passo de tartaruga, os seus segmentos verde-prata cintilavam com o campo energético que o alimentava. As portas assobiaram, exalando um ar impregnado de exsudações corporais, seguido de uma enxurrada de Sofontes, pequenos e grandes. A Central de Minavila estava operativa durante o ciclo diário de dezanove horas.
Depois de os passageiros terem saído, entrou no metro. Arrebolando-se enriba duma das várias formas que se não deformou ao pôr das suas nádegas, fechou os olhos. Receava dos detalhes do seu vindouro choio, que a agência omitira, como decote. Ainda que esta vez o seu cliente era uma BorboleMtidosa. A Estação Net tinha pouca informação ao respeito: honrados, discretos, insectiformes e grandes. Reus nunca gostara dos bichos, e dos que menos de todos, dos inteligentes. A forma ajusta-se à função. Ou era do revês, a função deriva da forma?
O metro atravessou o Sector Aquático por entre uma água bretemosa, alodada, acompanhada de um campo divisório tremeluzente, depois translúcido.
A necessidade de avisar à Defesa da Liga Interior zoava-lhe no cérebro como os mares ácidos de Alemmar. Ao melhor depois deste choio com a rainha BorboleMtidosa dava-lhe para uma passagem numa das naves alienígenas. Qualquer coisa lhe valia com tal de escapar desta estação; esfregar cobertas alienígenas ou viajar no porão de carga. As visões do massacre de Judeuel inundaram o seu pensamento. Quando a sonda tiver reenviado os dados a Judeuel, um mundo distante, do tipo AA, que não precisava terraformação, a abertura do remoto buraco de minhoca de Virgis e a colonização de Judeuel teria começado a sério.
Ao melhor já era um mundo morto. Quando a Liga Interior dera recebido a solicitude de ajuda da nova colónia, já todos haviam de ter sido massacrados. Reus fechou os olhos para ver as imagens da breve batalha, aniquilação melhor dito. Tão aginha como o seu esquadrão surdiu no Elo de Virgis, foram atacados por naves enormes com forma de halteres. As armas da Liga Interior escorregaram para fora dos cascos em mosaico, prateados e purpúreos, mas as armas dos alienígenas desfizeram o seu esquadrão em anacos de metal em menos de um hora. Até onde sabia, ele era o único sobrevivente. Quem eram os Halteres? Apareceram da nada e ignoraram todos os sinais comm.
Depois de ter chegado aqui, a estação AI comera-lhe uma boa ração dos seus fundos para realizar uma busca sobre os Halteres, mas não conseguiu nada. Os Halteres eram desconhecidos no Conglomerado de Thuurin.
Ergueu-se e fez fila detrás de um grande alienígena. Um metro vertical levou-o ao nível superior seguinte. Abaneou ao andar durante um segundo até que se adaptou à gravidade mais baixa, então abuliu a cruzar uma praça comercial, aguardando que Cctavilhão o atendesse ao momento. Não era a primeira vez nem ia ser a derradeira, mas chateava-se quando a agência lhe saltava enriba com um choio de última hora.
Holos de estranhos Sofontes com partes enxertadas passeavam pela entrada da Sala de Espera de Segmentação. Reus pôs o seu dedo dentro da febra latente e púrpura que assemelhava um orifício sexual alienígena e a porta transformou-se em aberta entre dois Chopacurridas abraçados. Abriu caminho com cuidado por entre a carne latente e caminhou cara à unidade de secretaria. Era uma massa de tecidos púrpura ondulantes sobre dos que empoleirava uma grande cabeça de um Chopacurridas empregado de secretário. Levantou-se um metro sobre o seu corpo, apoiado num pescoço com costelas, e olhou-o.
“Reus Saint Mark,” disse com sons sibilantes, mas, no resto, em perfeito Galegáctico Humano, “creio que estás aqui a procurares um rabo.”
Estou! Disse com a cabeça, sem lhe ter lei à sua própria voz para dar palavra. Alterações corporais drásticas deixaram-no sem síria. Tendo vivido mais dos seus sessenta anos nos mundos da Liga Interior, onde as crenças Puristas prevaleciam, tinha uma maneira fechada de ver a imagem corporal: Reus Saint Mark, humano puro e piloto, tenente primeiro de a bordo do Providência. Acabara-se-lhe a sorte no Elo de Virgis. Mas o seu dever fazia que continuasse indo para adiante. Defesa da Liga Interior tinha que ser avisada sobre os Halteres.
Reus lembrou as palavras da Capitã Bergham quando o ejectou na cápsula salva-vidas no meio do fogo inimigo mentres o Providência se desintegrava. “Sobrevive. Leva-lhe o intel a Defesa.” Mas passara perto de um ano e tudo o que conseguira até daquela fora obedecer a primeira ordem. Sobrevivera mas apenas de má maneira. A nave alienígena que atopara a sua cápsula salva-vidas à deriva subira-o a bordo e levara-o ao Elo de Minavila. Taxas de transporte dos alienígenas, inversão da estase na estação, e o consumo do essencial, ar, água, comida, pusseram-no a dever já daquela.
“Tens sorte de que CCtavilhão está justo para acabar. Atender-te-á em breve.” A cabeça desceu para a armação corporal e apareceu uma pequena gadoupa a esgaravelhar dentro do ecrã alojado na sua secção horizontal, a reorganizar os dados esborranchados. “Ah, o seu crédito está em vermelho.” Levantou a cabeça, a grande boca móbil a ressumar saliva.
“Febra Flex adiantar-lhe-á os gastos de Cctavilhão.” Reus evitou verbalizar a sua carrage. Não por causa de as Esferas Humanas serem muito melhores –ainda que não lhe cobraram aos Sofontes visitantes pelo ar- porém achava desconcertante que todo mundo nesta estação fora tão mercenário.
“Vou-o atender,” disse-lhe Cctavilhão à unidade de secretaria, açanicando o conjunto de tentáculos da cabeça. Acenou com um dos seus braços carnosos cara a um redanho palpitante que conduzia ao centro cirúrgico.
Caminhou através da entrada coberta e sentiu a sua carícia fria, peganhenta, mentres lhe quitava a roupa e o desinfectava. CCtavilhão seguiu-o para adentro, os seus quatro ciber braços a rangerem, as cutelas e micro furadoras a zunirem. Reus estarreceu e não pôde decidir o que odiava mais, os seus quatro tentáculos de cor índiga ou os seus reluzentes apêndices mecânicos.
“Sobre do estômago,” chiou Cctavilhão por entre a sua boca de falar, e acenou-lhe o berço cirúrgico.
Espido, Reus abaixou-se sobre a superfície opalina e latejante e sentiu os micro e nano sensores a entranhar-lhe o corpo.
“Consciente são vinte unidades, anestesiado são quarenta,” disse CCtavilhão.
“Consciente,” disse ele, virando a cabeça para o lado para evitar que a superfície peganhenta do berço lhe tocasse na boca.
Alguns dos braços carnosos de CCtavilhão descenderam até as suas nádegas, as pontas eram fitas de seda, do mais repugnante, pelo modo sensual que tinham de tocá-lo. O braço metálico brilhava prateado, e então uma dor aguda apunhalou-lhe a vértebra inferior, subindo-lhe ao direito até a cabeça. Reus abafou um laio.
“O pior já quase foi,” disse CCtavilhão. A cabeça moveu-se diante do ecrã de diagnóstico, o seu bico púrpura a trincar. “Vou-lhe dar um relaxante suave, de balde. É você uma boa cobaia, Reus Saint Mark.”
Sentiu um toque húmido nos quadris. O berço cirúrgico emergiu sobre os seus laterais e pingou-lhe sobre o corpo até que o envolveu, deixando-lhe só a cabeça ceiva. Palpitou e latejou e deu-lhe formigo em redor das nádegas, mas não podia juntar síria abundo como para ser repelido.
Devia de ter dormitado e acordou desorientado.
“A extracção do rabo BorboleMtidoso não lhe vai doer porque o girimolei de sinfebra.”
Reus agarrou as beiras peganhentas do berço e botou-se fora daquela febra alienígena. Fez um som como de chapuçar conforme o soltava. Abalou por um segundo e quase caiu de cu, porém um dos braços púrpura de CCtavilhão equilibrou-o.
“Olha, um rabo BorboleMtidoso totalmente operativo,” disse CCtavilhão, e indicou cara a um espelho. “O primeiro desenhado por mim.”
Reus colheu alento. Um humano de corpo pálido, magro, estava ali de pé, dando-lhe a um enorme rabo louro que açanicava húmido. Deu uns poucos passos, engrunhando-se cara adiante para se ter com o enorme peso. “O que faz?”
“Há-de-lho dizer ela. Nós não estamos aqui para despachar informação. Ademais, esta comissão tem mais cláusulas de confidencialidade do que tem Sofontes a estação.
Qualquer cousa que eu disser poderia ser usada na minha contra. Mas não desacougue, a BorboleMtidosa é a espécie mais honorável do Conglomerado de Thuurin.”
Reus fungou e tentou desapreixar-se de CCtavilhão.
“Não se remexa!” CCtavilhão tremou dele com dois braços tentáculo. “Inseri uma bateria de apoio na base do rabo, mas vai-lhe levar uns segundos integrar-se com o seu sistema nervoso.”
Reus engoliu e dobrou os músculos derredor do cóccix. O rabo tremeu e tirou-o para um lado. Agarrou um dos ciber braços de CCtavilhão, frio e macio baixo os seus dedos a tremelicarem. A cabeça dava-lhe voltas e abaneou.
CCtavilhão apareceu-se-lhe por em riba, os seus quatro olhos laranja disparados derredor das cavidades ósseas. Envolveu a cabeça de Reus nas suas quatro mãos carnosas, todos os seus trinta dois dedos a agromarem nano cílios e sondarem o seu cérebro.
Reus sentiu uma dor aguda em ambas as duas orelhas, depois, os dedos alienígenas soltaram-no.
“Isto deveria valer; ajustei o seu sentido do equilíbrio.”
“Obrigado.” A dor marchara e deu uns passos de prova. “Vai melhor.”
A boca de falar de CCtavilhão chiou, “O desenhador recompor-lhe-á o traje. A não ser que quiser você marchar levando unicamente a pele, vai-lhe levar mais uns poucos segundos.”
Ninguém pestanejaria um omatóforo ou conjunto sensorial de ele sair espido; muitos Sofontes abstinham-se da vestimenta. Para além de que poucos nesta estação conheciam os costumes humanos. Mas ele sentia-se melhor com a sua funda posta, principalmente porque não gostava da febra alienígena a esfregar-se contra ele nos transportes públicos. Esperava que o desenhador tivesse o bom gosto de deixar espaço para o rabo ao refazer-lhe a funda, se não teria que mandar-lhe à estilistifábrica fazer-lhe uma. Isso chupar-lhe-ia energia da Estação de ar, e incrementar-se-ia a sua dívida.
Satisfeito pelo buraco para o novo rabo, vestiu a funda e marchou.
* * *
Tradución por Afonso Xabier Canosa Rodríguez